sexta-feira, junho 10, 2005

Soneto para o dia dos meus anos

Como poeta nasci já quase canónico
(vede se isto não tem seu quê de cómico),
fazem-me quase um preto gentio camões —
não ligai que amanhã príncipe dos anões

serei. É certo que não errei o fio à vida,
seus corsos e naufrágios — fui mais fundo
que os demais? — em modo assaz rotundo
percorri-lhe as voltas, os sustos, a recaída.

Saberão vez alguma que nesta escura feira
tudo é sombra e deriva? Que nem as agudas
razões do pranto desvanecem esta surdina?

Não te iludas com os louros na cabeleira:
mais depressa se rirão das tuas agruras
dizendo «outro que não escapou à sina».

José Luis Tavares
Nasceu no Tarrafal num dia como este.
Desde 27/11/2004