Uma pedra no charco
“Korte kré ari, ari, ari”. Esta frase não foi escrita por William Shakespeare, mas na versão crioula da peça Sonho de uma Noite de Verão, Filóstrato, director de festas na corte de Teseu, ordena que os escravos façam uma peça para entreter a nobreza. Mas exige uma comédia. Esta cena surge como um provocação aos grupos de teatro e ao público mindelenses. Segundo o encenador da Companhia de Teatro Solaris, Herlandson Duarte, a corte representa o público e os escravos, os actores. E o recado é claro: o Solaris não está disposto a ser dominado.
No encerramento do Mindelact 2005, aquela companhia apresentou a comédia de Shakespeare, sem pretensão de arrancar risos da plateia. A um ritmo lento, viu-se um espectáculo plástico, quase que uma sequência de quadros fotográficos. De uma beleza inquestionável, é certo, pelo primor dos figurinos e da maquilhagem, mas muito lento e marcado - tanto quanto a peça Julietas, a estreia do Solaris.
Duas peças onde o encenador é protagonista, relegando o texto e a interpretação para segundo plano. Segundo Duarte, não se trata de uma adaptação e sim de uma tradução para crioulo. “Nós respeitámos o texto original na íntegra. Montamos esta peça, respeitando todas componentes da encenação de um clássico de Shakespeare". Mas o texto permaneceu frio e muita gente na plateia saiu sem entender bem a história. Mas será que isso é o mais importante para a Companhia Solaris?
Ao que parece, não. Aquela trupe teatral veio para provocar e sacudir a maneira como se faz teatro no Mindelo. O que não deixa de ser aliciante: de um lado, a comédia crioula, representada pelo grupo de Teatro do Centro Cultural Português do Mindelo/Instituto Camões, e de outro, Solaris, com os seus espectáculos plásticos, ousados e nada inocentes. Pretende-se que o público vá ao teatro, não para subliminar a vida num sorriso, mas para sair incomodado, mesmo que não saiba porquê.
De resto, só uma palavra de apreço ao trabalho do jovem encenador Herlandson Duarte. Pela ousadia. Embora num estágio experimental, Kutsch é brilhante, apesar de seus 19 anos.
Fotos de João Barbosa
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