quarta-feira, dezembro 01, 2004

ET IN ARCADIA EGO










Lápides e torres. P'lo fumo
coalescendo em tua garganta
ou p'lo murmúrio do papagaio
afinando seu repertório de injúrias,
sabes que é manhã.

Luz concebida para a morte.
Como esse azul que a distância esboroa.
Jamais o céu negríssimo pulsando
na gasta moldura da janela.

Tu, bípede que magnificaste esse vítreo
antiquíssimo esplendor, como anunciar
agora pelos desdoirados cimos
a insonora implosão das arcádias?

Recomeça onde o ar lastrado
dizer-te não possa desse dia em que,
esmaecido, o desejo ainda canta:

sem coercivo modelo
a vigiar o horizonte da representação,
todo o defeito é arte.

José Luis Tavares, in "Agreste Matéria Mundo"
Desde 27/11/2004